(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
A alta inflação em itens básicos castiga o bolso do brasileiro, mas nem sempre é percebida nos preços, nas prateleiras, pelo consumidor. Apesar de o aumento em itens de supermercado ter sido significativo nos últimos 12 meses — somente alimentos tiveram alta de 12,54% no acumulado de 12 meses, segundo dados do IBGE —, a "reduflação" (do inglês, shrinkflation) pode acabar camuflando a carestia desses produtos. A estratégia comercial das marcas visa diminuir a quantidade de produto nas embalagens, sem diminuir o preço.
A Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (ABIA) explica que essas alterações no peso ou na quantidade de produtos são definidas por estratégias de cada empresa, seguindo as regras vigentes na Portaria nº 81 (23/01/02) do Ministério da Justiça (MJ). Para isso, explica o presidente executivo da entidade, João Dornellas, as empresas avaliam demanda de mercado, pesquisas, mudanças de necessidades e comportamento de compra do consumidor, além de custos de insumos.
"Por serem comprometidas com a transparência, as empresas associadas da ABIA informam claramente qualquer alteração quantitativa no painel frontal da embalagem, em letras de tamanho e cor destacados, de forma precisa e ostensiva, bem como a quantidade antes da alteração", afirma Dornellas.
Simone Magalhães, diretora do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), explica que, em regra, não existe proibição da prática de diminuição no volume do produto e manutenção do preço, em razão da política de livre mercado. "Não é proibido, mesmo porque o preço é estipulado pelo próprio fabricante e comerciante. Se vende ou não, depende da força do mercado agindo para tentar diminuir o preço", afirma.
A diretora também explica que, embora a portaria 81/2002 do Ministério da Justiça obrigue que a informação de alteração esteja no rótulo dos produtos, não existem regras claras quanto à diagramação. "A informação escrita, a imagem, tudo aquilo que se comunica com o consumidor, se demonstra na rotulagem. A portaria 81 não diz, por exemplo, qual o tamanho da letra, o que causa impacto grande, pois o fabricante pode colocar a letra muito pequenininha e, ainda assim, estar obedecendo a portaria", ressalta.
Novas regras
O problema, contudo, está com os dias contados, segundo a diretora. Isso porque uma nova portaria do Ministério da Justiça, a 391/2021, revoga a portaria 81/2002 e traz novas regras para a comunicação da redução de quantidade. A regra já foi publicada no Diário Oficial da União, em setembro deste ano, mas entrará em vigor somente a partir de março de 2022, prazo que as empresas têm para se adaptar.
Entre as principais mudanças, está o prazo mínimo para permanência do aviso de alteração de produto na embalagem, que passará de três meses para seis meses. "O aviso deverá ficar no mínimo seis meses na rotulagem daquele alimento e a nova portaria também traz requisitos mais específicos, por exemplo, que essa informação precisará ser em caixa alta, em negrito, com uma cor contrastante com o fundo do rótulo e com, no mínimo, 2 milímetros", detalha a diretora e advogada especialista em direito do consumidor.
De acordo com a ABIA, as empresas têm desenvolvido produtos com tamanho reduzido, para atender a uma tendência e demanda mundial dos consumidores, estimulada pela "busca por uma dieta equilibrada, pela conveniência e praticidade, por uma maior consciência de consumo, buscando a redução do desperdício, e pela busca por otimizar o sabor e o frescor dos alimentos".
Em relação aos preços, a Associação que representa a indústria de alimentos diz que há uma série de fatores que contribuem para a composição do valor de um produto. "Os custos de produção são afetados pelo valor das matérias-primas e demais insumos, ajustes relacionados à inflação, entre outros, que vão além das questões relacionadas ao tamanho das embalagens", diz em nota.
A diretora do Brasilcon, Simone Magalhães, ressalta que a nova portaria veio em resposta à grande quantidade de redução em produtos e relembra que nem todos os itens podem ser alterados. "Determinados produtos, como arroz, açúcar, café, óleo, feijão, por exemplo, são padronizados pela portaria 153/2008 do InMetro, que diz quais os tamanhos obrigatórios desses produtos mais básicos para que as pessoas não tenham dificuldade em comparar preços", explica.
A "reduflação" atinge diversos produtos no mercado, desde pacotes de biscoito até caixa de ovos, que já são comercializadas com 10 unidades, em alguns locais. Na percepção do técnico de informática Felipe Benar, de 37 anos, os produtos que mais diminuíram foram o leite em pó, que sempre compra para o filho, a barra de chocolate e a caixa de bombom. "Antes, a caixa vinha cheia de bombons, agora você abre e já está vazia e o preço ainda aumentou. O chocolate em barra também, agora, parece uma versão mini da antiga barra. E o leite tem vindo metade da lata com produto", relata o morador do Riacho Fundo.
Fernanda Fernandes
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